Na reprogramação de motores a diesel é necessário calcular o AFR (mistura ar/combustível). Esta é a principal responsável pelo incremento de potência sentido, pelo que é importante garantir o correcto mapeamento da mesma.

Se tivermos o cuidado de analisar os mapas originais veremos que é normal encontrar diferentes misturas para os diferentes regimes de motor e especialmente para diferentes quantidades de massa de ar. Uma das maiores restrições dos fabricantes, no que diz respeito ao mapeamento das unidades de gestão de motor, é a garantia do cumprimento de emissões e a redução da opacidade dos fumos produzidos. (…e sim…eu sei que é um motor do grupo VAG, mas vou acreditar que é verdade o que acabei de escrever!!)
Utilizando como exemplo o motor 1.9 TDI, versão ARL – 150HP (Ficheiro aqui: 362706 ) comecemos por analisar a mistura do respectivo smoke map:

É importante perceber que a mistura em zonas de baixa massa de ar e rotação tem um valor baixo, isto é, é bastante rica. Reparem, por exemplo, na zona das 400 mg/cyc de ar e 1008 rpm temos uma mistura de 15.1:1. Teoricamente esta mistura iria permitir a emissão de fumo, sempre que fosse requisitada a quantidade de combustível permitida nessa zona. (cerca de 26.5 mg/cyc) mas na realidade existem outros factores que intervêm na quantidade de combustível, entre eles a EGR, os limitadores de binário e também o facto de ser um regime transitório, pois 400 mg/cyc é aproximadamente igual à massa de ar consumida ao ralenti, pelo que assim que existir uma pequena aceleração rapidamente sairemos desta zona.
Definição de AFR
AFR é um acrónimo inglês, deriva dos termos “Air to fuel ratio” e define-se da seguinte forma:
AFR = Quantidade de ar / Quantidade de combustível
Ou seja, é um valor que determina o rácio entre a quantidade de ar e a quantidade de combustível, logo, quando falamos em misturas de 15, 16, etc estamos na realidade a falar de misturas de 15:1, 16:1, isto é, dezasseis partes de ar para uma parte de combustível. Posto isto é fácil perceber que quanto maior, em número, for o AFR, mais pobre é a mistura, pois contem uma maior quantidade de ar para a mesma quantidade de combustível.
Alteração da AFR
A alteração da AFR, tendo em vista a reprogramação, pode ser feita de diversas formas, por percentagem, por adição ou pela substituição dos valores. Todas elas são válidas e vão depender do objectivo na reprogramação. Pessoalmente sou adepto de fazer a substituição total dos valores, e em casos onde existam mais do que um mapa de controlo de fumo (por massa de ar e por pressão de ar) defino os mapas de forma a que no fim a mistura nunca exceda os valores que me proponho inicialmente.
Cálcular o AFR via massa de ar:
Se o mapa a editar for o tradicional “Smoke map”, o qual é dado em função da massa de ar, então o trabalho de calcular a AFR é simples, já que ambos os factores se apresentam na mesma unidade. (mg/cyc)
AFR = massa de ar (mg/cyc) / quantidade de combustível (mg/cyc)
Cálcular o AFR via pressão de ar:
Se o mapa a editar for via sensor MAP, o qual é dado em função da pressão do ar, então para calcular a AFR teremos que, antes demais, determinar qual a massa de ar esperada para a pressão apresentada. Aqui o trabalho é um pouco maior, pois num motor alternativo de combustão interna a eficiência volumétrica depende de diversos factores, entre eles os mais importantes:
- Rotação do motor
- Num motor diesel em linha tradicionalmente o ponto de eficiência máximo situa-se na zona das 2000 r.p.m
- Temperatura do ar
- Para produzir pressão é necessário comprimir o ar, através um compressor ou de um turbo compressor, o que vai aquecer o ar e com isso diminuir a densidade do mesmo. Ao mesmo tempo os compressores e turbo-compressores também têm zonas de maior e menor eficiência, que levam a um maior ou menor aquecimento do ar.
O que é importante reter aqui é que se determinarmos uma quantidade de combustível fixa para uma determinada pressão, ao longo da rotação, a mistura não será igual, pelo que é necessário ter atenção ao mapear desta forma. Uma “regra de bolso” nestes casos é assumir que temos a eficiência máxima na zona das 2000 r.p.m e que perdemos, pelo menos, 15% dessa eficiência até às 4000/4500 r.p.m
Assim sendo, o cálculo da massa de ar esperada é feita utilizando a seguinte fórmula:
Massa de ar (mg/cyc) = ( Cilindrada (C.C.) x Pressão (Bar) x Eficiência volumétrica (%) ) / Nº cilindros **
Então o nosso AFR fica definido como:
AFR = ((Cilindrada (C.C.) x Pressão (Bar) x Ef. volumétrica (%) ) / Nº cilindros)/ Quantidade de combustível (mg/cyc)
Utilizar o Excel
O papel da folha de cálculo aqui é o de nos fazer poupar tempo e garantir que os resultados são os desejados. Muitas vezes, pela pressa, pela inexperiência ou por receio de fazer grandes mudanças acaba-se por apenas editar parcialmente estes mapas e fazer com que o resultado não seja o esperado.

O mapa acima é o resultado da AFR calculada de uma reprogramação de uma empresa nacional, que eu não vou dizer que é da TWE Motorsport, cujo o mapa foi alterado da seguinte forma:

Para além da alteração dos eixos, o combustível foi alterado via percentagem, o que resulta em diferenças na mistura consideráveis, principalmente nas zonas de maior fluxo de ar, temos a AFR a variar de 16 para 14… entre as 925 e 950 mg/cyc de ar. Cada um faz as coisas como quer, e isto até pode funcionar muito bem na estrada, mas para mim esta não é a forma correcta de o fazer.
Para que isto seja feito de forma automática, as células no excel foram definidas da seguinte forma:

Visto as unidades já estarem correctas, simplesmente copiei o mapa integralmente para o excel e ao lado abri um conjunto de células com a seguinte fórmula:
=c3/c4
Ou seja, 250/22
Utilizando esta fórmula é apenas uma questão de arrastar para o lado que o excel automaticamente irá adequar a fórmula para as seguintes células. Se repararem na fórmula temos c$3/c4, o símbolo $ é um “trancador”, isto é, neste exemplo as linhas estão trancadas, por forma a que quando arrastar a célula para baixo, no eixo da rotação, as células de referência serão sempre a da linha 3.
Como as operações de cálculo são apenas divisões simples, é fácil utilizar estas folhas para fazer cálculos rápidos:

Neste exemplo temos quatro tabelas:
- SMOKE MAP ORIGINAL: A fonte de dados, é nesta tabela que devem ser deixados os dados copiados do winols, assim como os respectivos eixos.
- AFR ORIGINAL: Esta tabela apresenta o AFR do Smoke map Original.
- AFR DESEJADO: Nesta tabela podemos editar as células com o AFR desejado.
- SMOKE MAP ALTERADO: Esta tabela é o resultado do AFR desejado, mostrando os valores de combustível a utilizar tendo por base o AFR.
De notar que apenas no smoke map original devem ser alterados os eixos, os restantes eixos são ajustados automaticamente.
Podem fazer o download desta folha de cálculo aqui. Caso necessitem de ajuda para criar outro tipo de tabelas ou conversões, estejam à vontade para perguntar e comentar.
Bom estudo!
** Esta formula é uma aproximação para o cálculo da massa de ar. A massa de ar contida num determinado espaço é definida por:
Massa = volume x densidade
A densidade do AR vai variar em função da temperatura e pressão sujeita:
Densidade = Pressão/(R(Constante) x T (Em graus Kelvin))
Unindo estas formulas ficamos com:
Massa (KG) = Volume(m3) x Pressão(Pa)/(R(Constante) x T (Em graus Kelvin))
Se assumirmos que as temperaturas de admissão se mantêm constantes, por exemplo a 30º (o que é mentira…), então podemos definir a densidade como:
Densidade = pressão / (287.058 * (273.1 + 30)) <=> Densidade = Pressão / 87000
A unidade da pressão é o Pa (Pascal), pelo que a conversão para BAR será de 1 Bar = 100000 Pa, então a nossa fórmula para a densidade pode ficar provisoriamente assim:
Densidade = pressão (Bar)*100000/87000 <=> Densidade = pressão (Bar) * 1.15
Assim sendo:
Massa(kg ou mg) = Volume (m3 ou cm3)x Pressão * 1.15
O volume é dado em metros cúbicos e a massa é dada em kg, pelo que ao transformar estas unidades iremos multiplicar o volume por 1.000.000 para passar a cm3 e a massa iremos multiplicar por 1.000.000 para passar de quilograma para miligrama, pelo que, se se introduzir os dados de volume em cm3, o resultado será em miligramas. Aplicando esta aproximação aos motores, então teremos que ter em conta a eficiência volumétrica, que dificilmente ultrapassa os 90%, pelo que, no fim, estas aproximações acabam pro se anular e os valores lidos pelo sensor MAF aproximam-se fielmente à fórmula inicialmente escrita acima.